sexta-feira, 15 de julho de 2011

AO REMINHO PELA BORDA D'ÁGUA, 67

À maneira*

António Cagica Rapaz

Para dizer a verdade, eu andava há muito com intenção de escrever um apontamento sobre expressões que me chocam. Não se trata de pesquisa nem ensaio, apenas breve alusão, abordagem ligeira, um caso ou outro. Desta vez, resolvi avançar porque encontrei uma dessas expressões em prosa de pessoa que me habituou a mais elegância no estilo.

Já várias vezes mostrei cartão bem vermelho a expressões brasileiras que nada têm a ver connosco, que não são fato à nossa medida, mas agora não se trata disso.

Quem ouve com alguma atenção o que se diz na rua, nas rádios e na televisão, já reparou com toda a certeza no “perguntou a eles” e nos incontornáveis “é assim”. Se a primeira é um erro estrondoso, a segunda é uma expressão correcta que só me choca por ser utilizada a torto e a direito, para introduzir, para intercalar, até para interrogar, como já ouvi. E é precisamente este excesso despropositado que torna a expressão quase ridícula e cansativa.

O caso do “óptimo” é semelhante. Não é erro dizer que a água estava óptima. O que é triste é verificar que o vocabulário das pessoas vai ficando cada vem mais reduzido, mais pobre, porque se utiliza sempre e só “óptimo” em vez de saboroso, deslumbrante, melodioso, admirável, etc.

Se bem observarem, notarão que os políticos não conseguem construir duas frases sem dizer dez vezes “nesta matéria” e cinco vezes “situação”. Para já não falar no delicioso “atempadamente” e no excelente “pronto”

Agora, uma que me caiu no goto foi “à maneira”. A intenção, ao que me parece, será exprimir um alto grau de qualidade ou de satisfação, certa forma de excelência. Mas a expressão apresenta-se incompleta e a sua estrutura fonética é algo manhosa.

“À maneira”, mas à maneira de quem, de onde ou de quê?

Seria correcto e faria sentido falar de uma caldeirada à maneira do Capitão Domingos. Mas dizer-se que as sardinhas estavam “à maneira”, é uma fórmula rasca, do calibre do “meu”, do “bué”, do “bazar” e do “curtir”.

Existem, é verdade, têm o seu lugar, mas esse lugar não será no quadro de honra da língua portuguesa. Não me parece que enriqueçam a nossa língua nem que façam a menor falta.

Esta é apenas a minha percepção das coisas, um bocado maldosa, admito, mas, de facto, “à maneira” soa-me mal, é pimba, lembra-me expressões como “de maneiras que”, “amaneirado” ou “maneirinho”.

Mas isto, repito, é apenas a minha opinião, sem qualquer pretensão elitista nem dogmática. Não me compete elaborar códigos de conduta linguística, não sou purista por vocação nem detenho o monopólio do bom gosto. Apenas há coisas de que gosto e outras que me desagradam. E, sobre elas, pronto, é assim, tenho o direito de me pronunciar, aproveitando o tema para uma charla à borda d’água. Água que, por sinal, está à maneira

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* Publicado originalmente em O Sesimbrense.

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